quinta-feira, 12 de abril de 2012

Passagem

Gosto de gostares, poucos, e um dos meus gostos é estar no metrô da Sé ou da República umas 23h30. Ontem o fiz, na Sé. Me faz lembrar coisas que fiz e não faço mais, coisas que fui e não mais sou. É um momento e horário em que gosto de ver gente, são interessantes: os estudantes que voltam pra casa, as namoradas que se despedem nas baldeações, a galera que volta dos happy hour nos barezinhos GLS levemente over encantadores dos quais até sinto falta, conversas, cansaços gostosos... Gente muito boa a galera do metrô da Sé às 23h30.

Curiosamente, sempre tem uma despedida lésbica em alguma escada ou entrada de vagão. Um desses beijos curtos, mas honestos, que me fazem sempre olhar fixamente. Ainda não sei muito bem o motivo: cumplicidade, curiosidade, surpresa, inveja, reprovação. Nunca beijei assim em público. E ao escrever nunca, até parei pra pensar melhor no assunto. Nunca? E continuo aqui pensando, mas não, acho que não, acho que me dei por satisfeita em beijar em bares, sem contar que minha mãe acha que intimidades assim, gay ou hétero, são desnecessárias em público.

Então eu olho! Aliás, olho tudo: o jornal do cara ao lado, presto atenção descaradamente na conversa alheia, leio junto as mensagem no celular. Sempre fui fácil de distrair, todas as professoras em reunião com os pais diziam isso, e sou assim até hoje. Divago ao menor sinal, durante aulas, durante conversas, escrevendo, divago nas divagações. Mas divagar durante conversas sempre foi o pior: ouço, ouço, ouço e ouço nada, de repente uma palavra-chave que me puxa de volta e eu: não entendi, repete essa parte!!! Não é digno, claro, mas sou eu. Pior quando a história se conclui e fica aquele segundo de silêncio onde se espera minha opinião: as vezes sou um vazio honesto e óbvio, outras sou uma tangente inteligente, o que e fácil, pq parece que os assuntos são os mesmos, o mundo gira em torno de si e sempre volta. Pelo menos me mantenho fisicamente disponível: outro dia vi um amigo começar a girar uma bolinha de gude na mesa, durante um atendimento, e fiquei aliviada em ver que não sou um caso perdido.

No final das contas, ontem me dei conta que adoraria trabalhar a noite. Sair para trabalhar às 23h30 via Metrô da Sé, ver pessoas e suas mochilas cheias de expectativas, as lesbiquinhas cada vez mais jovens cheias de amor e atitude, e voltar pra casa no fim da madrugada, quando o metrô reabre, os encapados matrix voltam das baladas, os meninos se recostam, os pálidos conversam, e os cosplayers circulam sem serem notados. É em momentos assim que sinto vida entrar pelos pulmões.

É, amo São Paulo!


4 comentários:

  1. Não haverá despedidas, desceremos juntas!
    Só espero não ter que ficar estalando os dedos para que vc desça comigo, rsrs, Sra. divagando, divagando... de vagão em vagão

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  2. não prometo nada, sei que isso é bem possível, mas atenta estarei a uma coisa só

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  3. Eu enquanto morava em Londres tb iniciava meu trabalho as 3 da madrugada e era fascinante ver tantas almas diferentes em diferentes situacos ...nao era metro mas no onibus tb se via muito...no comeco sentia medo depois percebi que eram inifensivos e passei a me divertir...entendo bem e me identifico com seu texto

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    1. Vc teve uma experiência incrível que também eu queria ter. Até me arrepia

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