quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Alienada!

Minha mãe me chama de alienada. Sou uma alienada incorrigível, graças a Deus. Num dos meus vexames de alienação, minha mãe falava com minha avó sobre Erenice e eu orgulhosamente enchi o peito e respondi: essa eu sei, é a mulher filha de desembargador que matou os pais. "Minha filha, faz o que você quiser da sua vida, mas assista ao menos o Jornal Nacional. É só meia hora!".

Meia hora! O que meia hora pode fazer conosco? Hoje assisti o Jornal do SBT, confessadamente sem querer. Era umas 19h30, vi as imagens de uma moça levando um tiro no rosto, o cara enfiando uma faca no peito, um corpo numa escadaria qualquer, dez caras que estupraram cinco moças e mataram duas durante festa numa chácara. Ah, sim, o inferno são os outros!

Escrevi exatamente essa frase num comentário de post da Natália Klein (www.adoravelpsicose.com.br). Aristóteles nos jura sociais. Rosseau nos arrumou até contrato. Por isso sou amor, sou esperança, sou Sartre até morrer: "O inferno são os outros".

Mas inferno, inferno mesmo, é relação com mãe. Gente do céu, que deve ser por isso que eu adorava a Cuca: a jacaroa nasceu de um ovo! Adorava também Angela RoRo cantando a música da Cuca no LP Pirlimpimpim, me dava medo e excitava, e deve ser por essas que sou lésbica e adoro rabo (ai, escrota!). E deve ser a relação com minha mãe que fez de mim uma amputada de vontades.

Minha família materna toda é estranha. Meus avós moravam em outra cidade, visitávamos pouco, tinha pouquíssimos anos e aquela gente estranha que falava com sotaque confuso e eu, sem nada pra fazer, ficava olhando o lustre da sala, antigo de fazenda, preto, de ferro fundido. Fundida tava eu, ali amoada e perdida, com minha avó cutucando minha mãe: "verifica se não é autista!". Ai, ai, aposto que minha mãe também queria ter nascido de um ovo. Tal mãe, tal filha, e por essas e outras não terei filhos. E acho muito solene, profundo e muito meu o final de Mémórias Póstumas de Braz Cubas. E nem ligo de ter um epitáfio parafraseado: "Não tive filhos! Não transmiti a ninguém o legado de minha miséria". Lindo!

Mas enfim, estar com a família é ter um momento 'olhando o lustre'. É melhor não falar, é melhor não pensar, é melhor alienar-se. Melhor esquecer. Esquecer o corte pigmaleão que tive que suportar, principalmente. E todas as vontades dela que tinha que cumprir. O gênio ariano, as brigas, os controles, as invasões de minhas quietudes, as vergonhas públicas, os "palpites" repreensivos. Até hoje estar com minha mãe é ter que falar quando não quero. E mesmo falando 'muito', depois de avidamente inquirida, minha mãe me olha chateada e preocupada, triste pela falta de comunicação, e diz: "você está deprimida?". Não, tô autista!
E eu to alienada pro mundo, com muito prazer. Não, não quero intimidade. Não, não quero riscos. Não, não quero me envolver, não me importo. E sim, conto mentiras brancas. As mentiras brancas, segundo um filme que vi e não lembro o nome, são aquelas que contamos sem ficarmos vermelhos. Traduzindo: na verdade, to me jogando pro mundo afetivo de olhos fechados e braços abertos! Hj era pra estar falando de fadas, anjos e possibilidades de paraíso, mas... Vejam só o que meia hora de realidade pode fazer conosco! Meia maldita hora!
E como mencionei Natália Klein e relação materna - mãe, te amo! - deixo aqui o episódio de Adorável Psicose que me fez rir muito, reproduziu meu mundo! Gente, mas é muito a relação com a minha mãe. Perfeito! Até assusta! E em homenagem à minha mãe e ao volume vertical que ela tanto adorava em mim, segue meu novo corte de cabelo. E a vida segue!



2 comentários:

  1. "Um instante pode mudar o mundo, um instante pode mudar tudo e fazer feliz um coração..."
    Mas olhar lustres é "digno" (gosto do acho digno!) e no escuro eles tendem a ser acesos, e isso pode provocar um leve sorriso amarelo no rosto dos autistas e alienados, e só esses sabem bem a sensação que o é. Eu sei... Bjs

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